Fusca79

E ai a Dani Kowalski me mandou um livro sobre Fuscas. Que primeiro, antes de ler, vi as figuras. E mais uma vez fui olhar um classificados de carros na internet pra tentar achar o Fusca, ou um Fusca, que fosse branco do ano 1979, 1300L. Como era o Fusca do meu avô, João Estigarribia, que ficou sob minha tutela durante bons quatro ou cinco anos. Abaixo o 1979 de 2015 (esquerda) e o 1979 lá em 2003 (direita).

No entanto a nossa relação começou em 1979 quando ele foi comprado zero. Primeiro carro dele, adquirido com a grana da aposentadoria, depois de ter trabalhado para a Varig durante praticamente a vida toda. Já o Fusca ficou na família, depois que o Seo João deixou este plano, até que foi roubado em São Paulo, enquanto meu tio usava o carro numa das voltas que dava pela maior cidade do Brasil. Um triste fim para um carro quase que totalmente original, desde zero na família.

Quando fiquei sabendo foi quase que ouvir que meu avô morreu novamente. Abaixo parado aguardando o sinal verde, na quarta-feira passada.

E foi no dia que recebi o livro da Dani, do Cosmo, que procurei pela enésima vez por um Fusca fantasma na internet. E encontrei um praticamente igual. Comparando as fotos, um expert não diria que é diferente, mas não era o mesmo carro, mas era o mesmo modelo e ano! Fuscas tem diversas versões e a 1300L 1979 foi a última da laterna capelinha, que não é a pequena, nem a grandona, redonda. Mas nesse ano de 1979 foram quatro modelos. 1300, 1300L, 1600 e 1600 com as lanternas grandes.

Achar um original nessa configuração é difícil. Eu mesmo, procurando por anos, não encontrei.

Não acredito em muita coisa, mas acredito em conjunção de fatores inexplicáveis para um fim. Dani comprou o livro, que me deu o start de procurar o carro e encontrar um igual. Mandei uma mensagem pro meu pai com o seguinte e sugestivo assunto “vamos comprar um Fusca?”. Em dois ou três emails, numa manhã de segunda-feira, ele achou que era uma boa ideia olhar o carro, desde que o vendedor ajudasse, diminuindo o valor do carro.

Ao lado, nós dois, em casa.

No anuncio a placa do carro estava errada, tinha um ITZ XXXX. Esse TZ também tinha na placa amarela original do carro do meu avô. Que era TZ XXXX. Ele dizia que o TZ era de Tesão, porque o carro era um tesão. kkk. Meu vô e suas histórias. Um cara que gostava de bichos, do seu Fusca, que tinha um cachorro que entrava no carro e só saia depois de dar uma banda pelo bairro, que acordava de madrugada para arrumar os passarinhos e ir na praia de bicicleta, que curtia Ray Conniff e Raul Seixas, muito antes de curtir ser moda e dormia no chão da sala depois do almoço. Uma figura.

Errar a placa em um anúncio de carro é normal, mas errar pro TZ? Isso só fiquei sabendo no dia que eu e meu pai fomos ver o carro em Porto Alegre, no Jardim Ipiranga, bairro em que foi a última residencia do Fusca antes da viagem sem volta para SP. Porto Alegre é gigante poderia ser qualquer bairro. E pior, o carro não estava lá, ele estava em Canoas, cidade em que meu avô morava quando trabalhava na Varig. Foi levado até POA para que a gente olhasse. Muitas coincidências.

Vimos o carro, estava muito bom, o cheiro era o mesmo do nosso. Ao dirigir pareceu igual, menos pelo volante pesado. Culpa dos pneus com pouquíssima pressão, fácil de arrumar. O medidor de gasolina que sobe e desce conforme o carro anda, o banco que parece que vai te ejetar a cada buraco.

Depois de alguma conversa, sobre Fuscas e antigos em geral, meu pai me olhou e perguntou “o que tu acha?”. Bom, foi como perguntar se um Border Collie quer bolinha. Não queria deixar transparecer toda minha ansiedade em botar mãos, bunda e pés na máquina. Enfim, fechamos o negócio, era uma segunda-feira, aguardaríamos compensar o pagamento e a papelada, que poderia demorar até a outra semana, visto que quinta-feira era feriado. Ao entrar no carro falei: “agora a gente tá zerado com o vô”, coisas de família.

E meu pai estava cheio de planos: “leva no mecânico, vamos colocar placa preta, tem que trocar isso, aquilo, vamos achar um encontro de Fuscas…”. Pensei que eu era o ansioso. Acima ele com o Fusca.

Na terça-feira ouvi a história do jogo do Grêmio X Corinthias, o 3 X 1, e resolvemos ir. Na quarta-feira fui até a Arena comprar os ingressos, mas antes liguei pra loja de carros pra perguntar se estava tudo ok pra pegar o auto. Tudo resolvido e marcado para as 13:30. Depois de um breve reencontro, meu pai foi até lá comigo, mas de lá foi para outro lado. Peguei o Fusca e fui até a nova casa do Grêmio comprar as entradas.

Ai mora mais um ponto significativo. Meu vô era um gremistão, daqueles que tinha na cozinha de casa o quadro do Grêmio Campeão das Américas e do Mundo, adesivo no carro, camisa e almofadinha. Estacionar o Fusca na frente da Arena, de forma totalmente desprogramada, poucos metros da bilheteria foi outra grande conjunção emocional.

Enquanto estava na fila, duas pessoas na frente, dei aquela olhada pra trás, pra ver se era realmente verdade.

A foto acima tiramos ontem, domingo. Agora temos várias coisas pra fazer nele, mas também temos muito tempo. É um carro que fez 36 anos agora em janeiro. Foi entregue para o primeiro proprietário em janeiro de 1979, em São Leopoldo, que é uma cidade que tem forte ligação com nossa família. Como falei, são muitas ligações. Ficou gigante o texto, mas preciso compartilhar isso para ler daqui a 10 anos e lembrar com mais detalhes, quando eu e o carro estivermos com 46 e 47 anos, como foi nosso encontro.

Obrigado pai e obrigado vô!